Por Ilan Ryfer
Certa vez estava conversando com um cliente a respeito de seu planejamento financeiro familiar quando tocamos no assunto seguro de vida. Imediatamente ele parou e disse que não faria, pois dava muito azar. Contei então que eu tinha feito para mim e que fazia parte de um planejamento sucessório bem construído. Ele então me perguntou se eu havia contado para minha esposa que eu tinha feito um seguro de vida. Confirmei que havia contado, uma vez que ela era a beneficiária. Ele então me disse que isso dava mais azar ainda!
Isso tudo para dizer que o seguro de vida, além de carregar toda a dificuldade de falar sobre morte, ainda traz uma carga de preconceito de um produto que foi historicamente mal utilizado. Tal como a previdência, seguros de vida foram historicamente vendidos por gerentes de bancos ávidos pelo atingimento de metas e por corretores mal preparados. Além dos produtos existentes no Brasil serem mal estruturados, dado que temos uma reserva de mercado nessa área. Mas essa realidade tem mudado nos últimos anos com a chegada de mais seguradoras ao mercado e a ampliação da oferta de produtos.
O seguro não é, por natureza, um produto financeiro. O investidor não deve esperar retornos financeiros positivos na compra de um seguro de vida. Funciona como um “hedge”, ou proteção, comum em mercados financeiros. Quando fazemos um “hedge” da carteira, não esperamos obter retornos positivos nessa posição específica, mas sim nos proteger de um cenário adverso. Seguros funcionam da mesma forma. Quando compramos o seguro de carro, não estamos torcendo para usá-lo. O mesmo vale para o seguro saúde ou qualquer outro seguro que comumente fazemos. Ninguém (ou pelo menos quase ninguém) faz um seguro e torce para receber. Funciona da mesma forma para o seguro de vida. Mas diferente do seguro de carro, em que se formos prudentes podemos passar a vida inteira sem usar, no seguro de vida a ativação é garantida.
Seguros de vida têm duas vantagens enormes no planejamento sucessório. Em primeiro lugar, pagam o benefício de forma rápida após a apresentação do atestado de óbito, não passando por qualquer processo de inventário e sem custos. Em segundo lugar, são absolutamente isentos de qualquer imposto, seja de renda ou ITCMD (Imposto de Transmissão Causa Mortis ou Doação). O pagamento do seguro de vida garante o recebimento rápido de caixa para os beneficiários, sem qualquer ônus atrelado. E o uso desse caixa pode ser fundamental em diversos casos, como iremos retratar abaixo.
Em termos de seguro de vida, existem 3 tipos principais sendo oferecidos no mercado brasileiro. O mais comum é o seguro de vida de renovação anual. Essa é a principal oferta das seguradoras de bancos, uma vez que oferece o maior retorno ao banco pelo menor risco possível (para o banco!). Nessa modalidade, o seguro vale por um ano, sendo renovado, ou não, dada a vontade do cliente e da seguradora. É, aparentemente, o seguro mais barato, principalmente quando se é jovem. No entanto, o custo sobe rapidamente nas renovações a partir dos 60 anos e muitas vezes a seguradora se recusa a renovar. Ou seja, quando estatisticamente mais precisamos do seguro, temos de pagar caro ou corremos o risco de não conseguir mais a renovação.
O segundo tipo é o seguro de vida vitalício atrelado a uma poupança. Todo mês (ou ano) se paga uma parte que compõe uma reserva resgatável. O segurado pode a qualquer tempo resgatar sua poupança, mas nesse caso, o seguro deixa de existir. Ou seja, se recebe ou o benefício em caso de falecimento, ou a reserva resgatável, mas nunca os dois. Nesse caso, cabe saber se a poupança feita é bem remunerada. Normalmente a remuneração, no Brasil, é IPCA mais algum percentual. Vale se atentar ao fato que nem tudo que é pago para a seguradora vira poupança, e esse entendimento é fundamental. E, também, cabe entender que até o segundo ano do seguro, nada do que se paga vira poupança, que começa a ser formada apenas depois do terceiro ano. Mas é um seguro vitalício, o que para algumas seguradoras significa para sempre e para outras seguradoras significa até os 100 anos (tem de ler o contrato!).
O terceiro tipo de seguro de vida é o a termo, que não forma poupança e só vale pelo prazo contratado. O seguro a termo pode valer por 10, 20, 30 anos ou qualquer outro período que a seguradora queira determinar. Uma vez contratado o período, a seguradora não pode cancelar o seguro até seu término (o segurado pode), mas não é obrigada a renovar por outro período após a expiração do prazo. Esse tipo de seguro é mais caro que o anual, pois também não permite reajuste de preço, somente correção pela inflação. Mas é bem mais barato que o vitalício com poupança.
E quais as aplicações práticas dos seguros de vida? Vamos supor que exista um patrimônio significativo que será transmitido via inventário para os herdeiros. Esses herdeiros terão de pagar todas as custas legais de inventário e podem não ter dinheiro para isso. Possivelmente existirão bens imóveis para serem transmitidos e que demandam pagamento de ITCMD. Além dos custos de vida da família que têm de ser pagos enquanto o processo de inventário não finaliza. Um seguro de vida pode ser projetado para bancar todos esses custos. Caso existam menores de idade na escola, pode-se fazer um seguro de vida específico para custear as mensalidades, e esse seguro pode ser feito de forma a ter um benefício decrescente ao longo do tempo, dado que o somatório das mensalidades futuras também é decrescente. Seguros de vida também podem ser usados por empresas para o caso de falecimento de um sócio e recompra da sua participação dos herdeiros.
Mas o pulo do gato, como mencionado no texto anterior dessa série, consiste na combinação de um seguro de vida com uma previdência privada, principalmente quando se está entre 25 e 50 anos. Nessa fase de vida, temos tempo suficiente para construir patrimônio e rentabilizá-lo. E todos os custos de seguros são relativamente baixos. Além disso, muitos têm filhos pequenos ou pensam em constituir família em breve. Nessa faixa etária específica, a combinação de um seguro de vida a termo, seja de 10, 20 ou 30 anos, conforme sua idade atual, com uma previdência privada, é a combinação mais eficiente possível. Traz todos os benefícios sucessórios e tributários de seguros de vida e previdência privada, minimizando os custos do seguro e maximizando a rentabilidade do patrimônio através do uso de fundos de previdência privada. O seguro de vida garante um valor a ser recebido pela família em caso de falecimento do segurado pelo prazo contratado, enquanto o patrimônio familiar está sendo constituído dentro do fundo de previdência e assume o papel de garantidor do padrão de vida familiar após a expiração do termo do seguro. Isso tudo sem passar por inventário, recebendo rapidamente os pagamentos e minimizando ou pagando nenhum imposto. E eu ainda ousei dizer que em mercado financeiro não existe almoço grátis….